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segunda-feira, 29 de julho de 2013

GESTANTE EM CIRURGIA NÃO OBSTÉTRICA

Boa tarde,

O caso de hoje é sempre desafiador e vale o relato. 
Paciente J.S.A.R.G, 29 anos, primigesta de 32 semanas, gestação gemelar, foi internada ontem a noite por dor abdominal em flanco esquerdo com irradiação para dorso também à esquerda. Esse quadro foi acompanhado de 3 episódios de vômitos. Após realização de ressonância magnética diagnosticou-se torção de cisto de ovário esquerdo (paciente com antecedente de ovário policístico).

Indicada Laparotomia exploradora convencional para desfazer a torção e realizar a pexia do ovário esquerdo.

Paciente anciosa, preocupada com as filhas (gemelares femininas), sem antecedentes pessoais relevantes, apresenta ao exame físico: Mallampati 4 (língua grande), Abertura bucal de 30 mm, edema em extremidades  ++/+4, IMC: 27,1 (ganho de peso na gestação de 12 kg até o momento), distância esterno-mento > 12,5 cm, extensão cervical adequada (restante do exame físico sem alterações). Em jejum por 8 horas porém o último episódio de vômito foi a 3 horas da hora marcada para a intervenção.

Optado pela anestesia geral em sequência rápida (porém com utilização de opióide e relaxante muscular não despolarizante). Solicitado ajuda de um segundo anestesiologista para iniciar o caso. A paciente foi colocada em "sniffing position", proclive, pré-oxigenada por 5 minutos e logo após a indução, realizada manobra de "sellick". 

Foto da Manobra de Sellick (artigo original do Dr. B. A. Sellick) Lancet 1961


Manobra de Sellick realizada por outro anestesiologista


Foi realizada a intubação orotraqueal com auxílio do "Glidescope" como primeira opção. Durante a visualização, pode-se notar a pressão do "sellick" na cartilagem. 
A cirurgia transcorreu sem intercorrências e a paciente foi extubada ao término também em "sniffing position". Sonar ao término com batimentos cardíacos fetais em ambos os fetos e paciente sem contração uterina (iniciada inibina desde o início do procedimento).

Podemos discutir muitos assuntos nesse caso mas o que gostaria de colocar é a decisão de utilizar um videolaringoscópio como primeira opção em casos onde você espera que pode ser difícil utilizar o laringoscópio convencional. Nesse caso, a associação de um mallampati 4 e manobra de "sellick" podem ser fatores complicadores da laringoscopia.

Caso aberto para discussão e comentários.

Abraço a todos,



4 comentários:

  1. A introdução dos videolaringoscópios (glidescope, cmac)tornou visíveis (e intubáveis) glotes que antes da introdução deles eram não visíveis (e não intubáveis) pelo laringoscópio convencional. Atenção para o fio guia do tubo traqueal que deve imitar a curvatura da lâmina e para o fato de que o auxiliar, vendo a mesma imagem que o anestesiologista que intuba, pode posicionar com MUITO maior efetividade a glote no centro da tela, ajustando a pressão da manobra de Sellick, que deixa de ter apenas a função de tentar vedar o esôfago, mas assume a função "posicionadora - BURP -like". Esta manobra de manipulação externa da laringe, tendo o auxiliar a mesma visão do intubador ajuda EM MUITO o sucesso da tentativa de intubação, fazendo da falha uma exceção rara. Não tenho a menor dúvida que os videolaringoscópios chegaram para ficar, em especial porque a curva de aprendizado deles é mínima se comparada à do fibroscópio. O grande mérito dos videolaringoscópios é transformar qualquer Mallampati 4 em Cormack 1!

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  2. Caro Marcelo,

    Concordo com seu comentário e acho muito pertinente. Especificamente nesse caso, utilizei o fio guia que acompanha o Glidescope. Devemos ficar sempre atentos ao posicionamento do fio guia em todas as nossas intubações seja com videolaringoscópio ou laringoscópio convencional.
    Acho ainda precoce a utilização de videolaringoscópio em todas as intubações pois isso agrega custos altos aos procedimentos e em pacientes sem preditivos de VAD, o laringoscópio direto é realmente muito eficaz (ainda bem!!!).
    Quando o preço desses dispositivos abaixarem e tornarem-se mais populares, acho sim que, assim como seu comentário, eles vieram para ficar pois se você pode ter uma melhor visão da laringe, porque não?
    Achei fantástico seu comentário quanto ao Sellick sob visão direta. Realmente o segundo operador pode entender o que está fazendo e otimizar a manobra para facilitar a intubação.
    Um abraço

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    1. Feliciano Vilela
      Gestante por si só já é um caso temerário, cirurgia de urgência, VAD e vomitando. Tenho muitas duvidas nesses casos. Primeiro, não poderiamos intubar acordada com fibroscópio? Pressão cricoide, com a visualização pelo glidescope, não fica otimizada? o relato fala de relaxante adespolarizante, qual foi utilizado? Poderiamos oferecer uma ventilação suave com pressão inpiratoria menorde 12 cm de H2O, conforme preconizado em intubaçao controlada com relaxante adespolarizante e sem Sellick? Abraços

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  3. Caro Feliciano,
    Pode-se fazer a intubação acordada sim, porém nesse caso, optei por utilizar o videolaringoscópio pois a paciente não tinha preditivos de VAD além de ser gestante e apresentar um Mallampati 4. Eu não tinha dúvida que conseguiria ventilá-la com máscara facial. Poderia ter feito com tópica mas a paciente estava muito ansiosa e pouco colaborativa. A pressão cricóide pode atrapalhar a IOT mesmo com o uso do glidescope. O "sellick"é diferente de um "burp". Ele pode comprimir a laringe e diminuir a visualização da mesma.
    O relaxante utilizado foi o cisatracúrio e eu mantive a paciente após indução com ventilação com pressão controlada e ventilação com máscara facial (Pinsp=10 cmH20 fazendo volume corrente de 300) pois não queria que os fetos fossem submetidos a nenhum momento de hipóxia. Lembre-se que a utilização de sellick diminui a chance de insuflação gástrica e permite pressões de insuflação maiores.
    Obrigado pelos comentários e dúvidas
    Abraços

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